Se tem uma coisa que é tão brasileira quanto futebol, feijoada e o vira-lata caramelo são os “causos” da roça. Crescer no interior – ou conviver com alguém que cresceu – é sempre ouvir histórias das mais simples às mais estapafúrdias. É com essa premissa que Orlandeli conduz Chico Bento – Verdade, a trigésima Graphic MSP publicada pela Panini.
Com sua arte singular, o autor visita pela segunda vez o famoso personagem de Mauricio de Sousa para colocá-lo de frente com Seu Adamastor, um visitante de longe. E, logo de cara, os dois não se dão bem. Afinal, o homem da cidade desrespeita a primeira regra ao interagir com uma criança de sítio: questionar a veracidade de uma história que envolva um Lobisomem ou o Caipora contada por Vó Dita.
Seu Adamastor, um homem que deixa um rastro de amargura por onde passa, está de passagem pelo sítio da família de Chico Bento com o objetivo de fotografar o belo jardim de Dona Cotinha. O motivo? Reproduzir suas flores em seu novo projeto: flores de pano, que reproduzem fielmente as reais, mas mantêm suas cores por anos e não demandam de cuidados como regar, podar etc.
Logo – para o suplício do homem da cidade – é o menino quem faz as vezes de guia e mostra a vizinhança para ele. Mas, no fim do dia, os dois acabam se perdendo no meio do mato e vivendo uma aventura que faz os dois se questionarem sobre o que de fato é verdade e o que não é, enquanto descobrimos o que deixou o homem tão sisudo e frio.
Vivendo de verdade
Ler Chico Bento – Verdade é divertido por vermos como a palavra que norteia a obra tem muitos significados e como todos eles estão retratados de alguma forma. Seja ao se perguntar se as histórias do interior são verdade ou não, na dualidade entre as flores de pano com as da mãe de Chico e, principalmente, se estamos vivendo de verdade ou só deixando os dias passarem.
Como no momento no qual Adamastor quase desiste de tudo na esperança de encontrar sua esposa Jaci. Ou quando Chico o leva para ver os violeiros Mula Manca & Curió e ele passa o tempo procurando informações da dupla pelo celular ao invés de curtir as modas. Quantas vezes nós não fizemos a mesma coisa em shows de ingresso caríssimo, nos quais boa parte foi passada com o celular fazendo stories para outras pessoas?
Assim, tocando em discussões profundas com delicadeza, Chico Bento – Verdade é uma viagem divertida e comovente à pluralidade do Brasil, que resgata a riqueza do nosso folclore, enquanto dá uma lição de vida pelo olhar inocente de uma criança.