O que vem à mente quando o assunto é música country? Pessoas usando bota e chapéu de cowboy, rodeios, cavalos e bolas de feno rolando pelo chão? Também, mas não é só isso! A música country também pode ser pop, e prova disso são os artistas da nova geração que movimentam multidões e lideram as paradas de sucesso.
Nos últimos anos, o gênero tem alcançado um nível de popularidade e poder financeiro que não era visto há muito tempo. O fenômeno revela como mudanças na tecnologia, como streaming, podem ajudar a moldar a cultura.
Uma matéria do jornal Financial Times mostra que, no ano passado, os gêneros “country” e “latino” foram os que mais cresceram em volume de streaming nos Estados Unidos, maior mercado fonográfico do mundo.
Não à toa, A Bar Song (Tipsy), do norte-americano Shaboozey, está há 19 semanas no primeiro lugar da Billboard Hot 100, ultrapassando o recorde anterior de outra música country, Old Town Road, de Lil Nas X com Billy Ray Cyrus, em 2019.
Outro exemplo de como o country vem retomando seu espaço entre o público jovem é Post Malone. Antes conhecido por sua trajetória no rap, ele decidiu abraçar de volta suas origens e lançar um álbum country em agosto deste ano.
Em uma época de crescente interesse por temas de cowboy — até Beyoncé lançou um álbum country em 2024 — Kacey Musgraves é um dos exemplos de como uma música “regional” pode ultrapassar fronteiras.
Country X Sertanejo
E, quando o assunto é música country, é quase impossível não comparar com outro ritmo semelhante e que também faz muito sucesso no seu país de origem, o sertanejo.
Existem muitas coisas em comum entre o country e a música sertaneja brasileira, passando pelas versões em português de músicas famosas e até mesmo as parcerias entre artistas norte-americanos e brasileiros.
Em uma indústria dominada por artistas masculinos (e, em sua maioria, brancos), country e sertanejo parecem resistir a tudo que possa fugir do estereótipo “cowboy”. Essa talvez seja a maior — e pior — semelhança entre os dois ritmos.
Kacey quem?
Nascida no Texas, Kacey Musgraves começou a cantar aos 8 anos e escreveu sua primeira música aos 9. Aos 19, participou do programa Nashville Star, que buscava uma nova estrela da música country norte-americana, ficando em sétimo lugar.
Até alcançar a fama, Musgraves trabalhou como compositora para diversos artistas e também para a trilha sonora da série de TV Nashville. Em 2012, assinou contrato com a gravadora Mercury Records e começou a compor seu primeiro trabalho profissional.
Quando se trata da obra de Kacey Musgraves, o que a diferencia são suas letras. As composições expõem suas opiniões contrárias ao conservadorismo do estilo musical.
Em uma entrevista, Kacey afirmou que faz música country para pessoas que gostam desse estilo e também para aqueles que não gostam.
“Minha música country é sobre histórias de verdade, sobre pessoas de verdade, e isso nem sempre vai agradar todo mundo.” Ela não tem medo de falar sobre o que acredita. Na música Follow Your Arrow, ela canta sobre como temos que escolher o que nos faz feliz, porque seremos julgados de qualquer jeito. Já em Dinner With Friends, fala sobre o que sentirá falta quando não estiver mais neste mundo: “meu estado natal do Texas, o céu, os cavalos e os cachorros de lá, mas (não sentirei falta de) nenhuma de suas leis.”
Kacey Musgraves já declarou ser contrária à eleição de Donald Trump e os ideais que ele representa.
Mesmo sendo “exceção” dentro da indústria, algumas de suas composições não fogem do estilo “country de ser”, já que muitas falam de amores, dores e sentimentos que não sabemos definir.
Discografia de ouro
Seu primeiro álbum, Same Trailer Different Park, foi lançado em janeiro de 2013 e, no ano seguinte, ganhou o Grammy de Melhor Álbum Country e Melhor Música Country para a canção Merry Go ‘Round.
Em março de 2018, lançou Golden Hour, seu melhor álbum até agora. Aclamado pela crítica, ganhou o Grammy de Álbum do Ano em 2019.
Já o álbum Star-crossed, lançado após o término de seu casamento, soa diferente de todos os seus outros trabalhos. Dividido em três atos de uma tragédia pós-romântica, se afasta da sonoridade tradicional dos seus discos anteriores.
Deeper Well, seu quinto álbum, lançado em março deste ano, retoma suas raízes com um toque de folk europeu. Destaques incluem Flower Child e Superbloom, com participação de Leon Bridges.
Por dentro da Deeper Well World Tour
Assistir a um show country na capital do Texas, um dos berços desse estilo musical, é com certeza uma daquelas experiências únicas que a vida proporciona.
A turnê começou em abril na Irlanda, já passou por 44 cidades em 6 países e agora entra em sua reta final. A Moody Center Arena, na cidade de Austin, no Texas, com capacidade para mais de 16 mil pessoas, estava lotada pelo segundo dia consecutivo.
O primeiro show de abertura (sim, teve mais de um, kk) foi do trio folk Nickel Creek, responsável pelo tema de abertura da série da Netflix Doces Magnólias. Eles voltam no meio do show para cantar junto com Kacey uma versão “acústica” do hit Kill Bill, da rapper SZA. Logo depois, entrou no palco a banda indie Lord Huron, em uma apresentação rápida, mas surpreendente. Recomendo ambos os artistas para quem gosta do gênero.

Finalmente, às 21h30, Kacey Musgraves entra no palco cantando Cardinal, faixa que abre o disco Deeper Well e que também foi escolhida para começar a turnê. Como alguém acostumada a assistir a shows de música pop, com dançarinos, cenários e grandes estruturas, confesso que não sabia o que esperar do show. Ao final da apresentação, entendi que nada disso fez falta: sua voz ecoou dentro da arena, não deixando espaço para mais nada.
Descalça, sentada em um banco de madeira com o planeta Saturno pairando sobre sua cabeça, Kacey interagiu bastante com o público, falando sobre como estava feliz de voltar para casa e também sobre como aquele era um espaço seguro para todos, independente de qualquer coisa. “Nós passamos por semanas caóticas aqui nos Estados Unidos, mas nada disso está aqui dentro hoje.”
E o que dizer do público, que eu mal conheço e já acho péssimo, rsrs? Estar com pessoas que passam o show inteiro sentadas e cujo maior momento de interação são as palmas é, no mínimo, entediante.
Nos momentos em que a cantora entregava ao público o poder de cantar alguns trechos, tudo o que você ouvia era meia dúzia de vozes perdidas pela plateia. Foram poucas as músicas em que escutei uma boa parte das pessoas cantando porque, na maioria do tempo, tudo o que eu ouvia era a minha voz e a voz da Kacey Musgraves, rsrs.