Engana-se quem acha que religião e política são assuntos mais polêmicos numa roda de conversa. Afinal, há um tópico em particular que pode acabar com amizades e criar rivalidades: adaptações de animes para o cinema em live-action. Não é à toa que seja tão polêmico, pois, nos últimos anos, não tivemos boas experiências com animes queridos indo às telonas com atores reais, como o Dragon Ball Evolution, Ghost In The Shell e Death Note, da Netflix. Por isso a recepção para Attack on Titan não é nada menos que temerosa.
Para quem não conhece, Attack on Titan (“Shingeki no Kyojin“, título original) é um mangá criado por Hajime Isayama – com 23 volumes lançados pela Panini, até o momento – e um anime com sua terceira temporada prevista para esse ano, contando a história de Eren, que vive dentro de uma muralha para se proteger de Titãs (criaturas gigantescas com forma humanoides e que se alimentam de humanos), e em um dia vê seu mudo literalmente desabar quando o Titã Colossal derruba um dos muros. Tanto o mangá quanto o anime são incrivelmente populares no Japão e Brasil e, agora, com a versão para os cinemas, sua popularidade poderá aumentar, mas a questão é: até onde uma adaptação pode se diferenciar da obra original sem perder a essência ou causar a revolta dos fãs? É o que essa resenha vai tentar mostrar.
Antes, é preciso ter em mente o que é uma adaptação para não sair “xingando muito no Twitter” após a sessão. Então, foi isso que pensei antes de ver o filme: “uma série de transformações realizadas numa obra de forma a adequá-la a um público diferente ou a transpô-la para o cinema, a televisão, o teatro, etc”. Sendo assim, transportar um mangá com mais de cem capítulos (por enquanto) não é fácil e, por mais fiel que o anime seja, ocorreram algumas mudanças que não afetaram a qualidade nem a essência da obra. Logo, a pergunta decisiva é: o filme perde essa essência? Não.
Como no anime, o filme possui a áurea de angústia e mal-estar nas cenas que os titãs aparecem. Ou seja, você realmente se sente tão claustrofóbico e desesperado quanto os moradores do vilarejo veem seus entes sendo devorados pelos titãs, um mérito que deve ser dado ao uso da câmera em certas cenas com o recurso em film footage, que dá a impressão de que estamos fugindo junto com os personagens. A trilha sonora, apesar de não ser primorosa como a do anime, contribui também na construção das cenas, e isso deve ser levado em conta. O diretor Shinji Higuchi (Shin Gojira) não economizou no sangue e na brutalidade ao longo da película, ponto este que demonstrou a fidelidade à obra original – há trechos de plot twists que, inclusive, foram recriados com exatidão.
Sim, houve algumas mudanças já esperadas, uma vez que o título possui 1h38 de duração, tempo no qual não é possível narrar toda trama dentro (embora haja uma segunda parte da história). Contudo, o filme cumpre seu principal objetivo: mostrar a guerra entre a humanidade e os Titãs. O lado negativo, porém, incomoda principalmente o fã foi no modo como alguns personagens são retratados e a modificação em suas trajetórias, como é o caso de Mikasa Ackerman. Quem leu o mangá ou assistiu o anime sabe como a Mikasa é uma das personagens mais incríveis e fortes da saga. Desde criança ela é temida por ser equilibrada e forte, sendo um dos membros mais fatais da tropa de exploração; todavia, não é isso que vimos no filme. Sai a Mikasa “badass” e entra uma jovem insegura e apaixonada pelo herói, que mostra seu potencial apenas após uma decepção. Não foi só Mikasa quem sofreu alterações, a Comandante Hange–san (que, no mangá, não tem gênero revelado) é uma das personagens mais inteligentes beirando a insanidade com sua obsessão em estudar titãs se mostra só… Insana, a ponto de constranger. Já que o tema é constrangimento… que lástima Sasha Blouse se tornou? Uma das personagens com trajetória de maior crescimento, Blouse assume a função de alívio cômico e esfomeada do filme – uma pena, pois, essas três personagens femininas são de grande importância.
Outro personagem que sofreu alterações que fazem os fãs pegarem tochas e rumarem para os estúdios, é Levi Ackerman, capitão da tropa de exploração, que foi esquecido pelo live-action. Levi é mais adorado até do que o protagonista Eren (e não é para menos!), ele é o membro mais respeitável da tropa, com cenas de ação que são sempre de tirar o fôlego. O mais próximo que se tem do Levi é o capitão Shikishima, um cara que praticamente quer ver o circo pegar fogo e tem uma relação um tanto duvidosa com Mikasa. Para quem não conhece a trama de Isayama, essa mudança talvez não cause tanto incômodo, mas é uma pena ver um personagem como Levi sendo deixado de lado.
Attack on Titan é fiel ao mangá e anime? Não por completo. É uma adaptação para ver sem preconceitos e que funciona como filme de ação. No entanto, não foi dessa vez que foi feita um filme que agrade aos fãs. E um conselho: não veja esse filme depois do almoço!
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