Após a emocionante distopia de Plano 75, a Sato Company traz ao país mais uma obra com atores e cineastas consagrados: Família. Dirigida por Izuru Narushima, que possui longo currículo de filmes dramáticos, sob o roteiro de Kiyotaka Inagaki, a produção traz um olhar comovente e angustiante sobre a imigração brasileira no Japão, e a necessidade da ressignificação dos laços afetivos.
Fenômeno Dekassegui
Antes de falar sobre a sinopse do longa, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (15), é preciso revisitar a crise financeira de 2008. O colapso que ameaçou o capitalismo intensificou a entrada de dekasseguis – os chamados trabalhadores estrangeiros – no país asiático. Isso provocou a ilusão de uma vida dos sonhos e mais bem remunerada, especialmente para os brasileiros.
Como resultado, a obra é iniciada com membros de uma colônia brasileira que tentam se adaptar à cidade de Toyota e com os trabalhos que lhes cabem no momento. Em meio à espontaneidade e alegria dos brasileiros, somos apresentados a Seiji Kamiya, interpretado por um dos atores japoneses mais conceituados da atualidade, Kōji Yakusho. Personagem este que, por diversas vezes, se fez lembrar do faxineiro de Dias Perfeitos, filme que representou o Japão no Oscar 2024.
Dessa vez, Yakusho dá vida a um viúvo que se dedica integralmente à cerâmica. Sua vida ganha um rumo inesperado quando recebe a visita do filho Manabu (Ryô Yoshizawa) e da nora argelina Nadia (Malyka Ali). Ao mesmo tempo em que se vê ajudando Marcos (Lucas Sagae), que acabara de brigar em uma boate e fugir da Yakuza, a máfia japonesa.
Samba, churrasco e xenofobia
Os caminhos de Seiji e Marcos se cruzam em um ato de compaixão, e se estreitam quando a namorada do brasileiro, Erika (Fadile Waked), se aproxima do artesão como uma forma de agradecimento. Ademais, uma das cenas mais cativantes é quando os dois núcleos se reúnem para mostrar Yakusho desfrutando de um churrasco brasileiro e com o samba na ponta do pé.
Enquanto isso, Marcos se vê refém de uma vida ameaçada pela gangue de Kaito Enomoto (Miyavi), que não esconde seu intenso ódio pelos brasileiros. Os dramas familiares, então, começam a entrar em cena e a figura paterna, seja ela qual for, se mostra indispensável para a narrativa.
O crime e o preconceito escancarado contra os estrangeiros se incluem às questões sociais, raciais e culturais apresentadas em Família. O filme ainda faz um alerta sobre o terrorismo e o impacto que as decisões alheias podem causar em nossas vidas. A busca por uma identidade e um país para chamar de seu, igualmente, se mostram presentes no longa, embora o diretor tenha passado do ponto ao representar os brasileiros no cinema.
Laços afetivos
Mais do que um filme sobre o conceito de família, a obra mostra que, mesmo em eventos trágicos, ainda é possível ressignificar os laços afetivos e sonhar com um novo caminho. Também é necessário destacar o talento do elenco brasileiro e a desenvoltura, especialmente de Fadile, em falar o japonês em sua forma mais fluída. Finalmente, uma produção que não te faz perder a esperança e que resgata o que há de mais humano em si, independentemente de suas origens.